1 de março de 2011

Rendição.



Acorrentamo-nos achando que seriamos livres. E o que, a nós, antes era o maior dos bens, agora está caído na terra, inerte. Foi esse o preço por brincar com fogo quando a consciência momentaneamente fugiu-nos da cabeça?
E eu achava que ambos éramos espertos demais para nos subjugarmos ao truque tão antigo que nos trouxe aqui...
Fomos nós... fomos nós a nos atear fogo quando, cúmplices, selamos a sangue o contrato que nos prendia e infiltrava-nos nesta rede de mentiras e desarmonia.
Fomos nós a estarmos em todos os lugares mais obscuros e distantes, na busca cobiçosa e ociosa por poder e impunidade a qualquer custo, nos tornando- aos poucos- receptáculos de esmolas das nossas próprias injúrias e ambições pretensiosas.
E enquanto avançávamos mais a frente, eu olhava de relance o reflexo de todo o medo interno que me encarava e acanhava do espelho, quase invisível, com olhos fugidios que brilhavam e reluziam de algum lugar do passado tentando a recordar-me do que, um dia, fomos.
Mas eu não prestei atenção... não atentei aos apelos de meus “eu’s” passados. Porque estávamos ocupados demais correndo rumo ao destino do qual nos arrependeríamos depois. Não prestei atenção quando eles pediram que reduzíssemos a velocidade e, lentamente, voltássemos.
Nós apenas corríamos e corríamos, ignorando os olhares que cruzavam astutos, curiosos e preocupados com os nossos. E eles apenas tentavam nos avisar que chegaríamos a este ponto, onde a dor não mais iria passar, onde de nada adiantaria a cobiça e o poder, onde só restaria medo e desespero.
Então nós chegamos, chegamos a este infame destino que nós mesmos escolhemos e traçamos, chegamos ao fim de nossas próprias covas que cavamos milimétrica e detalhadamente. E percebemos tarde demais.
Mas será... será que no momento da rendição ainda existirá alguma esperança? Será que no momento do julgamento ainda existirá piedade? Será mesmo que em meio à escuridão poderá surgir um foco de luz?
Sim, é esta a hora, e enquanto somos olhados sob pena daqueles que por muito tentaram nos alertar, permanecemos acorrentados às nossas escolhas- agora não sendo mais uma escolha, e sim uma conseqüência- e nos dignamos a esperar... esperar que a dor nos corroa mais e mais até o ponto aonde não haja mais dor. Esperar pelo momento da rendição. Esperar por piedade. Esperar por luz...

(Inspirado em “Moment of surrender” – U2)

2 comentários:

  1. Amiga...
    Uau! Adorei! Ficou ótimo, lindo, perfeito! E, sobretudo, agradavelmente diferente do que, mesmo sem querer, eu imaginei de antemão... Pode esperar outras sugestões, querida, pois, desta primeira que dei, vc criou algo realmente belo! Posso me gabar por ter tido uma pequena participação?
    Fico muito feliz por ter encontrado alguém com toda essa "vision over visibility"!
    Bjs!
    GK

    ResponderExcluir
  2. Que bom que gostaste! E sim, certamente tens parte nisso pois a indicação foi muito boa. ;)
    Continue indicando. Beijos.

    ResponderExcluir

"Escrevo em linhas tudo aquilo que, nas entrelinhas, a alma quer dizer; tudo aquilo pelo qual palpita o coração"
Ajuda-me? É sempre gratificante saber sobre o que pensam outras mentes!