20 de julho de 2011

Ela disse


Tão doce e sórdida é a aparência do quarto que, pela janela aberta, deixa entrar o frio inverno apoiado sobre mais algum sonho desfeito. É igualmente solitária e triste a fotografia iluminada pelas luzes bruxuleantes do candelabro que faz gorgolejar e tremer a figura dela, jogada no chão e agarrada ao vestido das memórias desgastadas. E ela permaneceu no chão até se sentir aquecida outra vez. Até o teu inverno partir.
Hoje é primavera, e não está mais tão gelado a algumas estações. Ela pode embarcar tranqüila e balançar em um vôo aconchegante nas asas da esperança, sobrevoando as colinas do que se concretizará em breve; sorvendo das nuvens pintadas de laranja e roxo que lhe renovam as forças; e protegendo-se no crepúsculo que encobre os pesadelos de outrora. Ela está na aurora agora, e eu acho isso certo, porque o jeito como ela ri quando está nervosa é infinitamente melhor do que o modo como ela chorava quando estava decepcionada. E agora ela é sempre tão engraçada, e agora ela se sente sempre tão linda.
Ela não tem mais que correr, está feliz, está quase curada. Quase não se lembra.
E esse é o porquê de eu estar imaginando o motivo pelo qual tu estás tentando dizer à ela agora o que estava havendo em tua cabeça, o que estava errado, e porque o inverno veio tão frio. Mas ela não irá ouvir, não mais. Ela tentou até o fim, agarrou-se nas esperanças impressas em teus fios de cabelo, vestiu por muito o vestido das memórias tão doloridas. E tu a deixaste jogada no chão do quarto, com a janela aberta e a luz assustadora do candelabro. Não importa quantas vezes diga que querias que o tempo voltasse atrás, ela não irá ouvir, não acreditará nisso de novo.
E quando ela acabou e te deixou para baixo, que tu tenhas reconhecido o quão merecido foi. E quando ela fizer barulho na cozinha de madrugada, tu não escutarás da maneira como eu escuto.
E quando ela sorrir, eu espero que tu saibas que os lábios não se retorcem para ti. E quando ela chorar, eu espero que tu saibas que as lágrimas não rolam por ti. E quando ela diz, inocentemente e quase sem querer, que quer alguém a quem amar, eu espera francamente que tu saibas que ela não pensa mais em ti.
Eu espero que tu saibas que eu não penso mais em ti...

(Inspirado em “She says” – Howie Day)


#NOTA: Quer sugerir alguma música? Eu agradeço! Aqui: http://2pitadasdesal.blogspot.com/2010/10/bla.html

3 comentários:

  1. Nossa! Adorei a ambientação, vi a cena completamente em todos os detalhes. Belo texto!
    Seguindo também!

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  2. O texto ficou lindo.

    Beijos e bom fim de semana :*

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  3. Eu espero que tu saibas que eu não penso mais em ti...

    É isso ai...falou por mim...pena que o ex não tem Blog...rs

    abraço

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"Escrevo em linhas tudo aquilo que, nas entrelinhas, a alma quer dizer; tudo aquilo pelo qual palpita o coração"
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